Cinco discos que ouvi nos últimos dias #7
Uma coisa legal: todos os artistas citados tem mais de 70 anos
Hyldon & Adrian Younge - “Hyldon JID023” (Jazz Is Dead)
Compositor dos sucessos “Na Rua, na Chuva, na Fazenda”, “As Dores do Mundo”, “Na Sombra de uma Árvore”, “Acontecimento” e “Velho Camarada”, Hyldon é considerado um dos grandes da história da música brasileira, mas, como acontece com muita gente, acabou sendo resgatado por um produtor estrangeiro. Com ajuda Adrian Younge, um dos sócios da gravadora Jazz Is Dead, o músico brasileiro lança “Hyldon JID023”, uma grande compilação dos temas que fazem parte dos mais de 50 anos de carreira dele — religiosidade, natureza e reflexões sobre a vida. Com uma banda afiadíssima e gravado em Los Angeles, o novo álbum de Hyldon traz toda sensibilidade de um repertório coeso, que une bem a energia e a melancolia. Foi uma das últimas gravações de Ivan “Mamão” Conti, baterista do Azymuth.
Avaliação: muito bom
Charlie Musselwhite - “Look Out Highway” (Forty Bellow)
Perto de completar 60 anos de carreira, Charlie Musselwhite não tem do que reclamar com o lançamento de “Look Out Highway”, 34º álbum da discografia, quando toca com a antiga banda que o acompanha dos shows pela primeira vez em estúdio e o resultado não poderia ser melhor. Misturando covers e canções inéditas, o gaitista de 81 anos prova estar em ótima forma. Considerado uma espécie de tesouro da música tradicional dos Estados Unidos, ele canta o repertório com maestria e trata a música como se a vida dele dependesse de cada uma delas — sempre uma ótima notícia para todos os fãs.
Avaliação: muito bom
Alaíde Costa - “Uma Estrela para Dalva” (Deck)
Prestes a comemorar os 90 anos, Alaíde Costa vive um novo momento da longa carreira. Finalmente reconhecida aos olhos do público e da crítica pelo talento, ela aproveita a chance para homenagear Dalva de Oliveira em “Uma Estrela para Dalva” — a cantora fez sucesso com o Trio de Ouro, formado com o marido Herivelto Martins e Nilo Chagas, e depois na carreira solo como intérprete, sendo considerada uma das melhores cantoras da história do Brasil. Aqui, Alaíde pega alguns dos grandes sucessos e dá uma nova voz para as canções tristes em uma releitura com muito capricho nos arranjos, que dão a ela o necessário para cantar tudo no tom e arrastar o ouvinte a chorar em diversos momentos. Alaíde apresenta o repertório para uma nova geração, enquanto ela mesma colhe os frutos de um sucesso tardio e cheio de beleza.
Avaliação: ótimo
Willie Nelson - “Oh What Beautiful World” (Sony)
Se existe alguém que pode ser chamado de lenda, essa pessoa é Willie Nelson. Aos 92 anos e perto de completar 70 anos de carreira, ele segue em atividade mais disposto do que nunca a cantar e protestar contra as injustiças da vida nas apresentações. Em “Oh What Beautiful World”, Nelson homenageia o amigo Rodney Crowell ao escolher 12 das melhores músicas de um longuíssimo catálogo musical. Delicado e certeiro mais uma vez na escolha do repertório, o cantor mostra que poucos serão da cara de um gênero como ele é a do country até hoje. No disco 77 da carreira, Nelson celebra e emociona em um trabalho certeiro mais uma vez.
Avaliação: ótimo
Marshall Allen - “New Dawn” (Week-End)
Você sonha em passar dos 70 anos? Dos 80? Sonha em fazer parte de um grupo muito especial de pessoas com 90 anos ou mais? Ou ainda, quem saber, quer entrar para um desses milagres da natureza de ultrapassar os 100? No último domingo (25), Marshall Allen completou 101 anos e, para celebrar a data centenária, lançou “New Dawn” há algumas semanas. Já é um baita privilégio ouvi-lo nas gravações da icônica Sun Ra Arkestra, da qual é o bandleader desde 1995. O álbum traz todos os elementos do jazz em música delicadas e com arranjos que misturam um pouco de tudo. Com faixas que variam entre os cinco minutos e meio e o mais de dez minutos (incluindo aí a participação de Neneh Cherry na faixa-título), o trabalho mostra que viver é muito mais do que apenas sonhar, mas conseguir fazer algo, à sua maneira, com algum tipo de satisfação própria e sem se importar com os outros. Caindo no clichê barato: não tem como não achar uma bonita lição de vida.
Avaliação: ótimo
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