In-Edit Brasil, dia 5: dias de luta, dias de glória
Críticas de “Ave Sangria, A Banda Que Não Acabou”, “A Última Banda De Rock”, “Aldo Bueno: O Eterno Amanhecer” e “Googoosh: Made Of Fire”
“Ave Sangria, A Banda Que Não Acabou” (2025, João Cintra e Mônica Lapa)
O Ave Sangria é uma dessas bandas do rock brasileiro que, quem teve a oportunidade de assistir ou comprar o hoje caríssimo álbum de estreia, jamais esqueceu. Para falar do início de tudo até o abrupto fim, causado por um puxa-saco da ditadura militar, Almir de Oliveira e Marco Polo, dois integrantes ainda vivos, subiram na rual dirigida por Roger Renor para relembrar esses momentos marcantes em “Ave Sangria, A Banda Que Não Acabou”.
Em um ‘road movie’ misturado imagens de arquivo, depoimentos de amigos novos e antigos e uma edição que usa e abusa dos recursos gráficos, o longa de João Cintra e Mônica Lapa pode soar meio quadrado para algumas pessoas, mas funciona para contar essa história. Os assuntos vão surgindo, desde o primeiro contato com a música, passando pela formação, escolha do nome, o sucesso de “Seu Waldir” e o regime proibindo o álbum de estreia — com direito a risco na faixa de abertura.
Pouco mais de uma hora não é suficiente para abordar todos os aspectos e momentos de um dos melhores e mais influentes grupos da música brasileira, surgido em um momento de efervescência em um dos momentos mais difíceis do Brasil. Apesar disso, o longa cumpre um papel importante ao funcionar como um registro de um momento importante.
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“A Última Banda De Rock” (2024, Lírio Ferreira)
Ao ver o nome o documentário “A Última Banda De Rock”, não tem como não achar uma escolha bastante ousada do diretor Lírio Ferreira. Ainda mais ao saber que se trata da história da Cachorro Grande, grupo gaúcho e um dos símbolos da geração do rock dos anos 2000, surgida quando uma nova leva de adolescentes (a minha, no caso) começou a dominar a MTV Brasil, a jogar no PlayStation 2 e começar o processo de ficar na internet durante a madrugada (pagava apenas um pulso).
Durante a produção do longa, a banda encerrou as atividades perto das comemorações dos 20 anos de carreira, então o clima não estava dos melhores em alguns momentos das entrevistas. E ao optar por falar de toda trajetória da banda e intercalar com números musicais do então último show, a edição pareceu querer estender ao máximo a duração, deixando um tanto cansativo em alguns momentos.
No mais, é importante destacar a união dos integrantes desde os primeiros momentos, a importante mudança para São Paulo e o estouro nacionalmente com o disco “Pista Livre”. E, como toda banda, brigas, separações, ressentimentos e outras coisas minaram a convivência, gerando o fim das atividades (eles voltaram recentemente) após o maior momento da carreira: abrir para os Rolling Stones.
Exageradamente longo, “A Última Banda De Rock” tem o mérito de ser bem feito, revelar detalhes sobre a banda e contar com a boa vontade e honestidade dos integrantes em falar das coisas boas e ruins.
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“Aldo Bueno: O Eterno Amanhecer” (2024, Adriano De Luca)
Registrar personagens muito específicos da música brasileira é um trabalho hercúleo, ainda mais a depender do personagem escolhido. No caso de Adriano De Luca, ele escolheu Aldo Bueno, sambista de mão cheia, ator premiado e, como visto nos primeiros minutos do documentário, um homem cheio de boas histórias para contar.
Amigos, diretor e retratado têm na intimidade um fator determinante no desenvolvimento da conversa, sempre muito natural desde o início. Com ajuda de pessoas importantes, seja nas vidas profissionais ou na pessoal, De Luca se esforça para conseguir contar uma vida cheia de percalços desde muito jovem, mas um sobrevivente a partir do momento da descoberta da arte. E ele é uma dessas pessoas ótimas como ator e cantor, em um combo que o levou a ser admirado e reconhecido por todo mundo como um grande artista no mais puro significado da palavra.
Com imagens feitas ao longo de cinco anos e do jeito que dava — com câmera ou no celular —, “Aldo Bueno: O Eterno Amanhecer” traz imagens dos filmes, um ótimo arquivo de fotos e um músico disposto a falar das tragédias pessoais e dos momentos de alegria, como ser o puxador de samba do Vai-Vai no histórico desfile de 1982 e vencer Kikito de Ouro pela atuação no filme “A Próxima Vítima”, de João Batista de Andrade. Um gigante que merecia essa homenagem ainda em vida.
“Googoosh: Made Of Fire” (2024, Niloufar Taghizadeh)
O Irã sofreu uma brusca mudança de regime em 1979, chamada de revolução pelos vencedores, quando passou a ser um país regido pela religião e governado pelo aiatolá Ruhollah Khomeini. A partir disso, a perseguição aos artistas foi feroz, com muitos sendo presos, outros exilados e alguns, infelizmente, mortos. Uma das perseguidas foi a cantora Googoosh, nome artístico de Faegheh Atashin.
Dirigido por Niloufar Taghizadeh, “Googoosh: Made Of Fire” aborda, com algumas idas e vindas, a vida de uma cantora famosa desde muito jovem que também conseguiu se destacar como atriz em alguns dos filmes iranianos clássicos da pré-revolução. O longa mostra que, apesar de um tanto melhor, o regime anterior não era um mar de flores brancas — para conseguir o primeiro divórcio, ela precisou abrir mão da guarda do filho ainda pequeno.
Mas o trabalho se destaca mesmo pela história de luta dessa mulher que, após a instalação da atual ditadura, foi forçada a parar de cantar e atuar, perdeu todos os bens e ficou mais de duas décadas sem poder sair do país, sofrendo todo tipo de opressão por onde ia. Até que um dia surgiu a chance de sair para fazer uma turnê pelo mundo, surpreendendo até ela mesma. Apesar de uma reviravolta, Googoosh não só fez sucesso, como virou símbolo da luta das mulheres iranianas por liberdade em meio a um regime cada vez mais opressor — o fim do longa homenageia as mulheres mortas após protestos por melhores condições de vida.
Mesmo em um formato bastante convencional e com todas as armas para fazer o espectador se emocionar, o longa funciona muito bem para iluminar essa mulher que, aos 75 anos, ainda é um símbolo de uma resistência que ainda sonha com dias melhores.
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